Machado de Assis POSSÍVEL E IMPOSSÍVEL



É um lugar comum em quase todos os poetas novéis maldizer do destino e tecer elogios ao desânimo aos vinte anos de idade.

Resulta daqui que as verdadeiras dores, caindo no descrédito comum, não podem achar indulgência da parte de ninguém; e quando um poeta, na aurora da vida e nos primeiros movimentos da inspiração, lembra-se de traduzir, em um hino de sua lira, uma dor que o consome ou um desânimo que o abate, a multidão recebe o hino e o poeta com o mesmo sorriso de incredulidade reservado para todos.

Será entretanto impossível esta situação? A mocidade é o tempo das ilusões; a mocidade dos poetas ainda mais. A imaginação mais viva dá maior corpo e maior luz aos sonhos e às quimeras. Tanto mais vivas são, tanto maior é a dor de os ver desvanecidos. Ora, figure-se um coração ardente, uma imaginação exaltada, um espírito veemente, abrindo os olhos ao mundo fantástico das quimeras e dos sonhos. Figure-se tudo isto, e veja-se se, ao primeiro desencanto, ao primeiro obstáculo, esta criatura sensível não deve manifestar as suas dores e os seus desprazeres na linguagem veemente e franca que Deus lhe deu.

É certo que são comuns os poetas desiludidos aos vinte anos; mas entre uns e outros há a diferença do falso ao verdadeiro. Há nas dores sinceras um tom de verdade singela e pura ingenuidade que se não confunde com os arrebiques mal aplicados da poesia chorona por convenção.

Tinha vinte e dois anos o herói desta narrativa. Era poeta desde os dezesseis. Era-o mesmo desde antes. Aos doze anos, estando a passear, com a família, em uma campina junto à cidade em que nascera, foi surpreendido pelo espetáculo que oferecia o lugar na hora do por do sol. Era uma estrofe de poesia rústica, uma lauda das Geórgicas. O meu poeta, deixando a família e os rapazes com quem ia, parou extático a contemplar o espetáculo. Só muito adiante a família reparou na ausência do pequeno; voltaram buscá-lo. Daí em diante o pequeno caminhou maquinalmente.