Tudo ali conspirava para a declaração do poeta ...



Tudo ali conspirava para a declaração do poeta. Estava diante de uma mulher esplêndida de beleza, de elegância e de graça. A luz, nem muita nem pouca, era suficiente para dar ao quadro um fundo vago e ideal.

Sílvia suportou o olhar amoroso do moço. Depois, abrindo os olhos em um sorriso divino, pronunciou estas palavras com um tom de curiosidade infantil:

- Por que me olha assim?

- Porque... disse o poeta.

E calou-se.

- Por que? disse a moça.

- Porque... ah! perdão!... não poderei guardar este segredo... Eu... amo-a...

Dizendo estas palavras Teófilo levantou-se e esperou de pé a resposta de Sílvia.

Sílvia baixou os olhos, deu uma volta ao leque, bateu com ele sobre o joelho, e olhou silenciosa para Teófilo.

O moço estava embaraçado. Que fazer diante daquele silêncio? Entretanto a sua felicidade dependia de uma palavra de afirmação da moça. Ela persistia calada. Teófilo fez um esforço e murmurou:

- Diga-me...

- Não lhe digo nada, disse Sílvia levantando-se.

- Por que?

- Porque... não sei. Ah!

Esta simples exclamação foi surda, e Sílvia mal pôde percebê-la.

A resposta da moça era dúbia. Podia afirmar, podia negar. Teófilo reparou nisto e sentiu um raio de esperança. Sílvia tinha dado alguns passos até a janela. Teófilo ia à janela quando a moça voltava.

- Prefiro a verdade, cruel embora, à dúvida, disse ele. Se me não pode amar é melhor que o diga francamente. Entretanto atenda bem para o estado do meu coração: é amor que eu sinto, amor puro, ardente, elevado. Sinto...

- Basta, disse Sílvia; serei franca: não o amo!

- Ah!

Teófilo encostou-se a um móvel.

- Não o amo. Talvez viesse a amá-lo. Mas como? Mal o conheço... Demais, este amor levaria a algum ato definitivo, e eu não estou disposta a casar-me...

Dizendo estas palavras, a moça foi sentar-se no sofá.

Teófilo estava atônito. Não eram as palavras de Sílvia que lhe pareceram estranhas; a moça podia não amá-lo. Mas o que lhe parecia estranho era o tom frio e indiferente com que elas foram ditas. Nem uma comoção, nem um pesar. E havia debaixo daquela frieza um desdém mal encoberto, talvez destinado a cortar de uma vez as esperanças do poeta.

A este curto diálogo dos dois seguiu-se um profundo silêncio, mal interrompido pelo leve ruído do leque com que Sílvia se abanava indolentemente.

Ouviu-se a voz do conselheiro que despedia o aliado político depois de assentar com ele em que a situação política não podia ser pior.

O conselheiro apareceu na sala pouco depois.

A presença do conselheiro era necessária na situação esquerda em que se achavam os dois. Sílvia levantou-se e foi ao pai, com um sorriso.

- Então, meu pai, já acabou as suas práticas de política?

- Já, já... E tu? Oh! não cuidei ter o prazer de encontrá-lo ainda aqui... Sr. Teófilo.

Teófilo, que se achava de pé, adiantou-se:

- É verdade, ainda aqui estava.

- Ora bem, há de tomar chá conosco.

- Desculpe, não posso... Já me ia embora.

- Já? Mas se não é negócio importante. Não tem mulher ciumenta...

- Tenho mãe, sr. conselheiro, mãe e irmã... ciumentas ambas... que me amam e a quem correspondo a estima e o amor que me têm.

Sílvia sorriu-se, batendo com o cabo do leque nos lábios...

Teófilo não reparou neste sorriso.

- Enfim, disse o conselheiro, se é assim, não quero ser a causa de dano algum a essas senhoras.

- Mas, até amanhã, não? Até... amanhã.

Teófilo apertou a mão ao conselheiro. Depois estendeu a sua a Sílvia, que lhe deu apenas as pontas dos dedos fazendo um leve sinal de cabeça... Mas quando retirou os seus dedos, Sílvia não pôde deixar de estremecer. Sentira que a mão de Teófilo estava fria de gelo.

O caminho entre a casa de Sílvia e a de Teófilo era longo. Teófilo venceu esse espaço absorto em amargos e dolorosos pensamentos. Palpitava-lhe o coração de dor, e no meio das torturas por que passava então, tinha grande parte do seu amor próprio ofendido.