De vez em quando o ardente sustentador da mãe da dona da casa aparecia alcoolizado, com um punhal formidável, querendo matar toda a gente...



Se era conhecido, o silêncio transformava-se em alarido.

- Ora, entra, deixa de partes!

Se era coisa nova, ou havia complicações, uma companheira dizia sempre:

- Vou ver.

Ia apenas prevenir. O que estava, saía por outra porta a vir tomar cerveja, e a Rosinha aparecia calma e sorridente:

- Só agora, seu mau! Estou à espera há tanto tempo!...

As damas estavam sempre em roupão, ou em camisa, os homens à frescata. A noite, assim por volta de uma hora da manhã, quando voltavam do teatro e dos cafés, organizavam-se ceias súbitas. Cada rapaz ia comprar uma coisa. Alguns, quando não tinham dinheiro nem para isso, vestiam as camisas das damas e ordenavam os outros com ares dominadores.

Pedro de Alencar assistia às cenas desenfreadas com um excelente bom humor. A princípio Flora Berta fazia sair o rapaz vigoroso por um dos quartos, para não se encontrarem. Pedro deu com o rapaz um dia à porta...

- O Sr. Francisco?

- As suas ordens.

- Subamos juntos.

- Parece-me...

- Nada mais interessante.

O Sr. Francisco subiu. Foi um acontecimento. Entre Francisco e Pedro, Flora Berta irradiava de orgulho e de prazer. Francisco era a sua satisfação física. Pedro o seu apetite de efeito. O segundo era mostrado como se mostra um colar de preço; o outro era invejado como um jantar sempre quente. E, verdadeiramente repartida, pendida para Pedro, com as mãos para Francisco, parecia felicíssima. De resto, embaixo, o automóvel de Pedro carbunculava na treva, e ela não resistia em ir correr a imensa Avenida do Mangue, um manto apenas sobre as espáduas nuas como Frinéia, só com o seu homem de luxo...

As conversas gerais nunca eram de uma inteira cordialidade. De suscetibilidade grande, essas damas zangavam-se por qualquer coisa, umas com as outras. Um vocabulário assustador surgia, portas batiam, gritos, ameaças de conflito. De vez em quando o ardente sustentador da mãe da dona da casa aparecia alcoolizado, com um punhal formidável, querendo matar toda a gente. As mulheres atiravam-se às janelas, pedindo socorro, e como a delegacia era próxima, minutos depois, soldados de espadagão trepavam escada acima, prestes aprender todos os presentes. Como, porém, o delegado tinha uma especial amizade a Flora Berta, tudo continuava na mesma. E ela vociferava indignada:

- Canalhas! Se não fosse eu, estava tudo preso!

Mas o agradável eram as tardes e as noites passadas na sua alcova paupérrima. Berta fechava-se por dentro, farta daquela vida, querendo uma casinha com palmeiras e canários. De um lado Francisco, sempre enleado, sorria; de outro, Pedro, muito alegre, fazia-lhe perguntas, e ela deitada, ria a morrer e contava coisas, como desde criança imaginara ser raptada, a fuga aos quatorze anos com o marido, um barbeiro, aliás, meio tolo, o abandono da casa por causa dos ciúmes da mamã, a quem sustentava.

- Afinal, sempre é mãe, não achas?