João do Rio
D. JOAQUINA




Aquele canto perto dos Telégrafos, às nove de uma noite de inverno... Em frente, os destroços da antiga Ucharia, embocando a rua Clapp, cheia de prédios grandes, com lanternas. Para baixo, os jardins sucessivos da praça até ao cais, sob o permanente espasmo de um estendal de låmpadas elétricas - tantas que na poeira azul da luz os transeuntes se destacavam ao longe como vistos por um binóculo de teatro. Varrendo a praça, a sacudir árvores e rodopiar folhas secas, gargolejando pela rua da Assembléia, um vento álgido corria a sua tragédia sem causa. Era no centro da cidade. Estava ermo. Parecia ao menos ermo. E no abandono silencioso - único e seguido sintoma de vida urbana -, de instante a instante os inúmeros carros elétricos rolando como trovões a retinir sons metálicos de aviso...