Olhava na calçada a estranha velha...



Augusto voltou-se e naturalmente estendeu a mão.

- Como estás tu?

Era uma forte mulher morena, de cabelos negros, simpática. Augusto disse:

- Aqui tens a Cidália. Durante cinco anos, lavadeira na minha casa.

- Mas que relações!

- Este patrão!

- Depois deu para costureira do Arsenal e vem à noite para cá... Foi a minha informante inicial.

- Deixe de contar a vida dos outros.

- Também que fim levaste, Cidália?

- Doenças. Esta vida é um inferno.

Eu, nervoso com aquele encontro de Augusto, não os ouvia. Olhava na calçada a estranha velha, que falava com um rapazinho insignificante e bem vestido. A mulher atraía os rapazes! E aquele parecia um desses exploradores baratos tão comuns...

- Lá está a velha! fiz segurando o braço de Augusto.

- É D. Joaquina... interrompeu a Cidália, familiar.

- Conhece-a?

- Foi minha patroa quando eu cosia para o Arsenal.

- Hein?

- Coitada! Para dar vazão às costuras tem três empregadas e trabalha desde as seis da manhã!

- Como?

- É uma senhora muito direita. O marido dela foi negociante. A vida dá muita volta...

- Impossível! Vejo-a por aqui nesta miséria.

- Ela precisa tanto!

- Precisa tanto e não tem vergonha!

- Oh!

- Procura com cabelos brancos rapazes como o que lhe fala agora!

- Aquele é filho, sr. doutor.

Recuei. Olhei Augusto, que se modificara.

- Sim, é filho, continuou a Cidália. Ela tem dois - aquele e outro mais velho; de bigode. Por causa deles é que faz tudo. Também foi com mimo que os perdeu. Depois da morte do marido, só pensava nos filhos, queria os filhos estudantes, era tudo para os filhos. Os meninos cresceram mal-educados, com más companhias... o Sr. sabe como os rapazes se perdem. Ela dava tudo. Era só pedir por boca. Ah! se o Sr. visse aquela casa agora! Os rapazes não estudam nada, caíram na påndega. Acordam tarde. É ela quem lhes leva o chocolate à cama, quem os ajuda a vestir. E almoço na mesa, eles logo na rua e ela outra vez na máquina, até de noite. Foi uma vez quando voltava a pé, de levar costuras, sem dinheiro para o bonde, que encontrou aqui um sujeito atrevido. A fome é negra, e gostar de filho é pior que fome. D. Joaquina, coitada! viu que podia fazer mais algum dinheiro e voltou envergonhada. E, como o tempo habitua a tudo, agora tem este serão...

- E os filhos sabem?

- Como não? São lá tolos? Só não dizem porque não lhes convém. Cada vez mais vagabundos, mais exploradores. E ela gostando cada vez mais deles. A maior felicidade de D. Joaquina é quando eles atravessam o largo e vêm lhe pedir a bênção. Eles só vêm, os marotos, quando precisam de dinheiro...